We are Carnaval, a origem

Raquel Sheherazade, âncora do Jornal do SBT e autora de diversos comentários polêmicos nas bancadas por onde passou, dedicou ao Carnaval uma de seus primeiros desabafos que ressoaram nacionalmente. Há três anos, ainda pela TV Tambaú, da Paraíba, falou sobre os festejos que se iniciam nesta sexta-feira, em discurso com referências históricas, exemplos atuais e um aviso: essa não é uma festa popular. “Balela”, diz Raquel: “o Carnaval virou um negócio dos ricos”. Talvez o mundo não seja trágico como diz a jornalista, mas é de se pensar: Carnaval é business, assim como é business o seu grande hino.

Só o rótulo de hino do Carnaval baiano diz muito sobre a importância mercadológica da música We are Carnaval. Ela foi composta por Nizan Guanaes, um dos maiores publicitários do Brasil e do mundo. Nizan é um monstro do mundo publicitário, criador da agência DM9 (que depois se fundiu e virou DM9DD9), participou da fundação do iG (internet gratuita) e é presidente do Grupo ABC de comunicação. Já foi incluído pelo jornal Financial Times como um dos homens mais influentes do mundo (em 2010) e obteve destaque mundial em outras oportunidades.

foto_nizan_guanaesDá para imaginar o cuidado com que escolheu as palavras de We Are Carnaval em sua composição? Isso porque trabalhar com música tem sido rotineiro para Nizan no mundo publicitário. Ele é o autor, por exemplo, da propaganda do Guaraná Antarctica que virou hit nacional (pipoca na panela começa a arrebentar…). Também participou de campanhas presidenciais, e nelas compôs jingles e mais jingles. Não há como mensurar a contribuição comercial de We Are Carnaval para o festejo na Bahia. Comercial mesmo: com seus trios, abadás, pacotes de viagens, passaportes da alegria…

A música já começa em tom de propaganda oficial: “Ah que bom você chegou, bem-vindo a Salvador, coração do Brasil. Vem, você vai conhecer a cidade de luz e prazer correndo atrás do trio”. Milhões de pessoas, ano após ano, pagam caro para poder fazer isso. “Vai compreender que o baiano é um povo a mais de mil. Ele tem Deus no seu coração e o diabo no quadril”. Genial, Nizan. Para fechar com chave de ouro, vem o refrão internacionalizado, mas de fácil compreensão. “We are Carnaval, we are folia. We are the world of Carnaval, we are Bahia”.  Se isso não servir para business – ainda mais em ano de Copa…

Na verdade, Margareth Menezes cantou essa música acompanhada do Olodum no sorteio dos grupos da Copa do Mundo, realizado na Costa do Sauípe, na Bahia, em dezembro de 2013, e transmitido para o mundo todo. É de se perder a conta da quantidade de artistas consagrados que gravaram o sucesso: Ivete Sangalo, Jammil e uma noites, Asa de Águia e muitos outros. O responsável pelo sucesso dela foi Netinho, em 1996. Curiosamente, We Are Carnaval não foi veiculada como um jingle. Nizan compôs a música, e Ricardo Chaves gravou em 1991, sem grande alarde.

A melhor parte é que antes de ser o hino do Carnaval baiano, a canção foi usada como forma de arrecadar verbas para as obras de Irmã Dulce. Beatificada em 2011 e indicada ao Prêmio Nobel da Paz em 1998, a “beata dos pobres” lutou contra as desigualdades até sua morte, em 1992. Em honra a isso, ainda em 1988, mais de cem artistas se reuniram e gravaram um clipe cantando We Are Carnaval. Nenhuma parte da letra foi suprimida – nem “prazer“, nem “diabo no quadril“. Essa é a origem da música: a campanha realizada pela DM9 de Nizan Guanaes.

A pegada publicitária não tira a relevância nem a importância da música. E também não a deixa menos divertida. Mas que bom é saber que em cada “we are the world of Carnaval” temos também muito de business – mesmo com as melhores das intenções.

Cool covers: Tennessee Waltz

 
Tennessee Waltz é uma canção extremamente popular nos Estados Unidos, especialmente no estado homenageado, unidade federativa do sudeste do país com pouco mais de 6 milhões de habitantes e nove hinos oficiais (sendo o último deles a música “Tennessee”, de John R. Bean). A música-tema deste post foi a quarta a ser escolhida digna de representar o 16° estado norte-americano, admitido pela União em 1796. Em sua versão original, é realmente uma valsa:

Há controvérsias sobre o compositor da música, mas oficialmente a letra foi feita por Redd Stewart, sendo musicada por Pee Wee King, ambos músicos da cena country da década de 40. Os dois estariam a caminho de um show em Nashville, capital do Tennessee, quando ouviram no rádio a música “The Kentucky Waltz”, de Bill Monroe, considerado o inventor do Bluegrass, estilo tipicamente sulista derivado do country e que tem raízes britânicas, mas conta com influência do jazz pelo uso da improvisação. A versão tennessiana foi feita a caminho da apresentação e gravada por Cowboy Copas, outro representante do country, em 1947.

A canção foi regravada inúmeras vezes ao longo de seis décadas por músicos de renome e destaque. A versão que primeiro fez sucesso, no entanto, foi feita em 1950 por Patti Page, cantora pop que a levou ao topo das paradas e a tornou um dos maiores sucessos da década. Um dos registros mais interessantes – e recentes – foi feito por Norah Jones, em DVD gravado em 2002 (a música aparece nos “extras”).

Tocando junto de Adam Levy (guitarra), Andrew Borger (bateria) e Lee Alexander (baixo), Norah muda o andamento da canção sem perder o sentimentalismo. “Tennesseee Waltz” fala de uma desilusão amorosa: o sujeito está dançando a tal de “Valsa do Tennessee” quando encontra um velho amigo; ele pede para dançar com a acompanhante do sujeito, que concede, mas, quando se dá conta, o amigo conquista a amada, deixando o protagonista apenas com as mágoas restantes. É uma história triste, amigos.

Norah Jones – Tennessee Waltz

Há também a versão “jovem guarda” da britânica Alma Cogan, com direito a “shalalala” nos backing vocals:

Alma Cogan – Tennessee Waltz

 
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