Bom mesmo era no primeiro disco

 
Quem nunca na vida, ao discutir sobre música, se deparou com algum saudosista e ouviu alguma indigesta afirmação do tipo: “essa banda era legal, depois ficou muito pop”. Nas entrelinhas dessa, bom mesmo era naquele tempo, quando só o saudosista e uma meia dúzia de gatos pingados ouviam. Depois popularizou, tornou-se comercial demais, “puseram umas batidas”. Resumindo, pra ele “virou uma bosta”.

Acontece que que grande parte das maiores bandas da atualidade tiveram mudanças consideráveis na musicalidade ao longo da carreira. Já vi muita gente malhando bandas exatamente pelo motivo citado no primeiro parágrafo. “Ai, bom mesmo era quando o Green Day era punk”. Punk? São contra qualquer tipo de evolução ou amadurecimento que o artista possa ter. O legal pro “saudosista-musichato-meio-hype-meio-alternativo é citar a comercialização. Como se fosse ruim tudo o que é comercializado. E como se fosse um argumento válido.

O Coldplay teve uma evolução vertiginosa, hoje um monstro, uma banda de show impecável. O trabalho de hoje não é o mesmo trabalho de 2000. Progrediu, floresceu, aprendeu. Claro que ninguém vai ser bobinho o suficiente de pensar que isso aconteceu simplesmente pelo fato romântico de eles quererem um trabalho mais maduro. Não, pô! Óbvio que existe também um interesse comercial e toda a parafernália que contém o showbiz. Mas não dá pra falar que ficou pior, independente se massificou ou não.

Eu sou a favor do baião com o rock, o jazz com o dance. Pra outros, parece que o que é bom, é o imutável, o mais-do-mesmo. Ainda na faculdade, recordo de muitos estudantes de música que defendiam com unhas (bem grandes pra tocar violão) e dentes o jazz intocável, o blues puritano. E a bossa nova então? Ai de quem mexesse na queridinha. Ai de quem fizesse uma releitura um pouquinho mais ousada. Tudo bem, poucas coisas contribuíram pra música no Brasil como ela fez. Mas poderíamos ter evoluído muito mais se não houvesse esse engessamento lamentável.

Basta sair do sonzinho cômodo ali para que alguém já comece a choramingar nostalgias. Ás vezes, a impressão que tenho é de que há uma certa preguiça ao tentar compreender a música, a obra, o disco. Ou seria uma certa vaidade, fugindo do que foi popularizado? Ou até uma aversão a um sistema capitalista onde é feio o artista pensar no dinheiro? Mil possibilidades.

Mas sempre vai ter um desse na rodinha do violão, contribuindo para a estagnação.

Gu Sobral é Ilustrador e Diretor de Arte, canta blues na Mr. Brown e 90’s na The Sexy Lobster. Já é velho conhecido aqui no NTR.

 
 
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