Uma crítica rude sobre Rude, do Magic!
A revista americana Time elegeu Rude, do Magic!, a pior música de 2014, então eu já sei que não estou sozinho nessa. Rude é o grande sucesso dessa banda canadense de reggae – o que, por si só, já é algo diferente de se ver. Está no primeiro álbum, Don’t Kill The Magic (2014) e fez um sucesso absurdo no mundo todo – foi número 1 do ranking da Billboard nos Estados Unidos, Reino Unido e Brasil, por exemplo. Basta ouvi-la uma vez e pronto: já dá pra sair cantando. O problema é o que é cantado.
É uma questão de postura. Na música, o sujeito levanta cedo num sábado, veste seu melhor terno e sai de carro a toda pra ir à casa da namorada conversar com o pai dela, um sujeito conservador. Ele bate na porta “com o coração nas mãos” e pede: “posso ter sua filha pelo resto da minha vida? Diga sim, diga sim, eu preciso saber”. A resposta é desagradável: “você nunca vai ter minha benção enquanto eu viver. Só lamento, meu amigo, mas a resposta é não”. Aí vem o ponto crucial. Como reagir?
O refrão de Rude é um choramingo dizendo: “por que você tem que ser tão rude? Você não sabe que eu sou humano também?”. E ele ainda complementa, como quem dá de ombros: “vou casar com ela mesmo assim”. Fica no ar uma sensação de “eu nem queria sua aprovação mesmo”.
O protagonista tinha várias estratégias a seguir, desde a diplomática (tentar convencê-lo, provar-se uma cara responsável, atencioso ou o que for necessário) até a mais radical (confrontar o sogro pra valer, fazer ameaças). Ele escolhe a mais frouxa de todas: faz birra na porta da casa da namorada. Estamos sendo rudes demais nessa crítica?
Talvez fique essa impressão porque Rude é, na verdade, uma adaptação: a versão original foi feita pelo vocalista Nasri para uma ex-namorada, com quem tinha uma relação conturbada. O verso “por que você tem que ser tão rude” é na verdade pra ela. “Ela era rude, eu era rude. Nós estávamos em um momento rude”, esclareceu, em entrevista a uma rádio canadense. “Foi assim durante todo o relacionamento. Isso foi o que nos manteve juntos e o que acabou nos separando”, complementou.
Eventualmente, a banda decidiu trocar a letra, e aí apareceu essa história de pedido de permissão para casamento. Não é algo baseado em fatos reais – aliás, Nasri não casou com essa tal garota e também não namora ela agora. O curioso é que Rude gerou uma série de paródias. Por partes:
1. O pai super protetor.
Nessa versão, feita pelo pai da garota em questão, a pergunta é feita é: “você diz que ter minha filha pelo resto da sua vida, bem você vai ter que fazer mais do que hambúrgueres e fritas pra isso. Saia do porão da sua mãe e faça alguma coisa”. No refrão: “por que você me chama de rude? Por fazer algo que qualquer pai faria?”. E ainda com ameaças: “(se você) casar com essa garota, vou socar sua face”.
2. A filha feminista
Ah, a versão da filha: ela na verdade se surpreende por ver o pai e namorado brigando pra saber quem vai ficar com ela. E quem disse que ela quer? O refrão mostra isso: “vocês dois estão sendo brutos, vocês sabem que eu sou uma pessoa também. Agindo como pessoas controladoras, ninguém perguntou minha opinião”. Tomem essa os dois.
3. A mãe conservadora e religiosa
Essa é a versão mais bizarra. A mãe na verdade é uma religiosa fervorosa que avisa ao namorado: você não é o cara certo pra minha filha porque não aceitou Jesus ainda. O refrão termina com “antes de casar você precisa rezar”. E depois ainda vem: “casar com a minha filha? Ela precisa de um homem de Deus”.
O álbum de estreia do Magic! é repletos de músicas nesse formato de Rude: uma espécie de pop-reggae extremamente moderno, pra cima. A maior parte das canções fala sobre relacionamentos. E nenhuma é Rude.