Taylor Swift confronta, ignora ou usa o Spotify?

Não houve trocadilho musical que impedisse a decisão bombástica da cantora americana Taylor Swift, que no início da semana passada retirou todo o seu catálogo do serviço de streaming Spotify. A empresa postou playlist engraçadinha pedindo a volta dela e usou nomes e trechos de diversas músicas, em mensagem postada: Taylor, we were both young when we first saw you, but now there’s more than 40 million of us who want you to stay, stay, stay. It’s a love story, baby, just say, Yes. Não adiantou. Todos sabem o motivo dessa manobra. Só não se sabe ainda os efeitos.

Taylor já vinha sinalizando que tomaria ação contra serviços como o Spotify. Em entrevista recente ao Wall Street Journal, afirmou que música não deveria ser gratuita porque “é arte, e arte é importante e rara, e coisas raras e importantes devem ser valorizadas”. Ela não concorda com os direitos pagos pela empresa, entre US$ 0,006 e US$ 0.0084 por execução. Se a cantora recebe a maior cota, você teria de ouvir uma música 120 vezes para render a ela US$ 1. Taylor Swift tirou sua obra do alcance de 40 milhões de pessoas – cerca de 10 milhões que pagam valores mensais – em 58 países.

Primeiro, Taylor retirou de lá o álbum mais recente, 1989 (2014). Esse é o primeiro a vender 1,3  milhão de cópias desde 2003, quando Eminem conseguiu esses números com o The Eminem Show. Ele desafia os números decadentes da indústria musical na última década. E mais: de acordo com o jornal britânico The Guardian, 25% dos usuários do Spotify já ouviram alguma música da cantora americana, sendo que ela aparece em 19 milhões de playlists e seu single mais recente, Shake It Off, era o número 1 em streamings. Mesmo assim, ela na sequência tirou tudo.

“O que eu posso dizer é que a música está mudando tão rápido, e o cenário da indústria musical em si muda tão rapidamente, que tudo que é novo, como o Spotify, me parece um grande experimento. E eu não estou disposta a contribuir com o trabalho da minha vida com um experimento que eu sinto que não recompensa de forma justa escritores, produtores, artistas e criadores de música. Eu simplesmente não concordo com a perpetuação da noção de que música não possui valor e deveria ser gratuita“, explicou a cantora, em entrevista ao Yahoo! Music na terça passada.

Parece justo, Taylor. Mas até onde você vai levar isso?

Afinal de contas, serviços como o Spotify estão custando dinheiro a artistas como Taylor Swift: de acordo com a revista americana Money, uma pesquisa da MIDiA Reserch determinou que 23% dos usuários de streamings costumavam comprar mais de um álbum por mês. Isso significa que agora a cantora vai aumentar ainda mais os números de vendas? Não. E essa é a questão. Se os fãs não piratearem os álbuns, vão simplesmente recorrer ao Youtube, Grooveshark, SoundCloud, Pandora, LastFM, Rdio ou qualquer outro modelo semelhante e continuar ouvindo suas canções. E talvez pagando ainda menos.

taylor1989A não ser que a cantora apareça com alguma alternativa revolucionária, a decisão vai se limitar a não compactuar com algo que com o que ela não concorda – o que é mais do que justo, mais uma vez. Uma hipótese é Taylor Swift estar usando seu absurdo potencial de mercado para produzir mudanças nesse sistema de remuneração que julga incorreto. Essa hipótese é reforçada pela notícia de que o iTunes deve lançar um serviço de streaming para fazer frente ao Spotify. A cantora deverá ser procurada. E se aceitar, as milhões de pessoas que ouviram suas músicas poderão migrar de programa.

Se nada mudar, o Spotify vai sobreviver sem Taylor Swift da mesma forma como sobrevive sem Beatles, AC/DC e The Black Keys, entre outros artistas que não liberam sua obra para o serviço. Se na semana que vem ela desistir da decisão e recolocar as músicas à disposição, já vai ter saído no lucro, de qualquer maneira. Tem sido apontada por publicações do mundo inteiro como uma das artistas mais poderosas da indústria musical, obrigou essa discussão a ocorrer e ganhou mais mídia do que jamais conseguiria no Spotify. O jornal The Guardian até relacionou o anúncio a uma posição feminista da artista. Isso, Shake it Off jamais renderia.

PS1. Já falamos de Taylor Swift aqui antes e de maneira não tão lisonjeira. Leia

PS2. SE ESSE ÁLBUM REALMENTE SAÍSSE EM 1989, SERIA ASSIM:

We are Carnaval, a origem

Raquel Sheherazade, âncora do Jornal do SBT e autora de diversos comentários polêmicos nas bancadas por onde passou, dedicou ao Carnaval uma de seus primeiros desabafos que ressoaram nacionalmente. Há três anos, ainda pela TV Tambaú, da Paraíba, falou sobre os festejos que se iniciam nesta sexta-feira, em discurso com referências históricas, exemplos atuais e um aviso: essa não é uma festa popular. “Balela”, diz Raquel: “o Carnaval virou um negócio dos ricos”. Talvez o mundo não seja trágico como diz a jornalista, mas é de se pensar: Carnaval é business, assim como é business o seu grande hino.

Só o rótulo de hino do Carnaval baiano diz muito sobre a importância mercadológica da música We are Carnaval. Ela foi composta por Nizan Guanaes, um dos maiores publicitários do Brasil e do mundo. Nizan é um monstro do mundo publicitário, criador da agência DM9 (que depois se fundiu e virou DM9DD9), participou da fundação do iG (internet gratuita) e é presidente do Grupo ABC de comunicação. Já foi incluído pelo jornal Financial Times como um dos homens mais influentes do mundo (em 2010) e obteve destaque mundial em outras oportunidades.

foto_nizan_guanaesDá para imaginar o cuidado com que escolheu as palavras de We Are Carnaval em sua composição? Isso porque trabalhar com música tem sido rotineiro para Nizan no mundo publicitário. Ele é o autor, por exemplo, da propaganda do Guaraná Antarctica que virou hit nacional (pipoca na panela começa a arrebentar…). Também participou de campanhas presidenciais, e nelas compôs jingles e mais jingles. Não há como mensurar a contribuição comercial de We Are Carnaval para o festejo na Bahia. Comercial mesmo: com seus trios, abadás, pacotes de viagens, passaportes da alegria…

A música já começa em tom de propaganda oficial: “Ah que bom você chegou, bem-vindo a Salvador, coração do Brasil. Vem, você vai conhecer a cidade de luz e prazer correndo atrás do trio”. Milhões de pessoas, ano após ano, pagam caro para poder fazer isso. “Vai compreender que o baiano é um povo a mais de mil. Ele tem Deus no seu coração e o diabo no quadril”. Genial, Nizan. Para fechar com chave de ouro, vem o refrão internacionalizado, mas de fácil compreensão. “We are Carnaval, we are folia. We are the world of Carnaval, we are Bahia”.  Se isso não servir para business – ainda mais em ano de Copa…

Na verdade, Margareth Menezes cantou essa música acompanhada do Olodum no sorteio dos grupos da Copa do Mundo, realizado na Costa do Sauípe, na Bahia, em dezembro de 2013, e transmitido para o mundo todo. É de se perder a conta da quantidade de artistas consagrados que gravaram o sucesso: Ivete Sangalo, Jammil e uma noites, Asa de Águia e muitos outros. O responsável pelo sucesso dela foi Netinho, em 1996. Curiosamente, We Are Carnaval não foi veiculada como um jingle. Nizan compôs a música, e Ricardo Chaves gravou em 1991, sem grande alarde.

A melhor parte é que antes de ser o hino do Carnaval baiano, a canção foi usada como forma de arrecadar verbas para as obras de Irmã Dulce. Beatificada em 2011 e indicada ao Prêmio Nobel da Paz em 1998, a “beata dos pobres” lutou contra as desigualdades até sua morte, em 1992. Em honra a isso, ainda em 1988, mais de cem artistas se reuniram e gravaram um clipe cantando We Are Carnaval. Nenhuma parte da letra foi suprimida – nem “prazer“, nem “diabo no quadril“. Essa é a origem da música: a campanha realizada pela DM9 de Nizan Guanaes.

A pegada publicitária não tira a relevância nem a importância da música. E também não a deixa menos divertida. Mas que bom é saber que em cada “we are the world of Carnaval” temos também muito de business – mesmo com as melhores das intenções.