Hallelujah, a origem

Hallelujah é uma das canções mais carismáticas e famosas da história da humanidade, gravada e interpretada por mais de cem artistas dos mais diversos estilos. Foi composta pelo canadense Leonard Cohen e gravada no álbum Various Positions (1984). Sua criação levou cerca de dois anos; e o perfeccionista Cohen criou mais de 80 versos para ela. Isso fez com que ele próprio tenha executado-a com diferentes letras e interpretações ao longo dos anos. Dependendo do intérprete, a música pode ter entonação depressiva, exultante, sexy. Ela pode se tornar uma música nova a cada dia: depende do estado de espírito de quem a executa. É uma canção incrível em todos os sentidos.

Com esse poder transformador, seria no mínimo leviano expor aqui a origem definitiva da música. Há um livro feito apenas em torno dos versos de Cohen (The Holy and the Broken, de Alan Light). Neste texto, o NTR mostra a sua interpretação para Hallelujah, desenvolvida a partir de muita leitura, diferentes versões e, é claro, visão pessoal. A letra usada é a do cover mais consagrado, de Jeff Buckley, no álbum Grace (1994) – essa que você vê no topo do post. Fala sobre amor e a imperfeição problemática que é a experiência de amar.

Hallelujah

Ao que tudo indica, o próprio Leonard Cohen vem tentando, ao longo dos anos, compreender o uso da expressão Allelujah (Aleluia). Trata-se de uma palavra hebraica composta por Hallelu – “louvem, glorifiquem” assim no plural mesmo, um chamado a todos – e Jah – uma espécie de diminutivo para Jehovah, um dos nomes bíblicos para Deus. Cohen inicialmente queria manter a tradição milenar de canções com esse termo, mas desvirtuando-o do sentido religioso, como se o seu Hallelujah pudesse ir além disso. Pense nessa palavra como uma forma de exaltar tudo – tudo que é perfeito e o que não é; a vida. Nos versos, isso é permeado pelo sentimento de amar.

“A música explica que existem vários tipos de Hallelujah. Eu digo: todos os Hallelujahs, perfeitos e errados, têm o mesmo valor. É um desejo de afirmar minha fé na vida, não de uma forma religiosa, mas com entusiasmo, com emoção”, explicou Cohen, em entrevista de 1985. Nos versos, o imperfeito transparece, e apesar de tudo o que ele expõe, há sempre um Hallelujah, sempre o louvor, sempre a fé. O caminho que encontrou para mostrar isso foi justamente usando passagens bíblicas. Em cada verso cabe uma explicação histórica, religiosa e política que não será aprofundada neste texto. O NTR foi extremamente sucinto nesse aspecto. O leitor terá que nos perdoar.

hallalujah11Davi de Israel, Betsebá, Sansão e Dalila

Davi era um humilde pastor escolhido por Deus para suceder Saul como rei de Israel. Tinha muitos dons, dentre os quais a música – e é isso que fica evidente no primeiro verso. É dele o “acorde secreto” que agradava ao Senhor – Davi, integrado à corte de Saul, acalmava o espírito do monarca com sua harpa. Aí entra a genialidade de Cohen. Quando cita and it goes like this, the forth, the fifth, os acordes casam com a letra: as notas tocadas são exatamente do quarto e quinto graus da escala em que a música foi composta. O mesmo vale para the minor fall – um acorde menor que ‘derruba’ a melodia – e major lift – novamente um acorde maior.

The minor fall and the major lift é também uma referência de juízo: as pessoas pequenas caem, enquanto os grandes se erguem. Pela narrativa bíblica, Davi é escolhido por Deus como o sucessor de Saul. Ele governaria a Tribo de Judá e, depois, o reino de Israel. Cohen encerra a estrofe com “o rei desnorteado compondo o Hallelujah“. Isso já dialoga com a próxima estrofe, que aborda o episódio em que Davi, já rei, observa do alto do telhado Betsabá, mulher de Urias, se banhando – e é seduzido. Ele então a seduz e comete pecado aos olhos de Deus. Grávida, Betsebá torna-se mulher de David após a morte do marido no campo de batalha, mas seu filho morre por juízo divino. Punição.

Na sequência, Cohen evoca a história da gananciosa Dalila, que faz chantagem emocional para descobrir a força de Sansão e o faz adormecer sobre seu colo para que os filisteus cortem seus cabelos – tudo em troca de moedas de prata. Quando Cohen canta “e dos seus lábios ela desenhou um Hallelujah“, encerra um trecho da música que mostra como o amor pode levar a situações trágicas. No Livro dos Juízes da Bíblia, Sansão tem os olhos arrancados e é mantido prisioneiro dos filisteus, mas recupera a força com ajuda divina para pôr abaixo um templo, matando seus inimigos e também a si próprio.

Davi foi acometido pela luxúria ao ver Betsebá e pagou por isso. Sansão abriu seu segredo mais íntimo à mulher que amava e também pagou por isso. E, apesar da dimensão dessas ações e do amor envolvido, ouve-se de novo entoar: Hallelujah.

hallelujah2Problemas de relacionamento

Nos dois versos seguintes, Cohen é mais direto e mais amargo. Ele fala sobre experiência com relacionamentos quando diz: baby I`ve been here before, I`ve seen this room and I`ve walked this floor. E mostra que sabe como é ser sozinho também. Então faz referência ao Marble Arch, arco de mármore erguido em Londres para dar acesso ao Palácio de Buckingham (hoje ele fica em um lugar diferente da cidade). Apenas a realeza podia passar pelo arco. Quando canta I`ve seen your flag on the Marble Arch, ele avisa que o amor não é uma marcha da vitória, algo que se domina e faz seguir um caminho determinado, sempre triunfante e organizado. Não. É um Hallelujah frio e quebrado.

A estrofe seguinte é ainda amarga, mas extremamente erótica. Começa com Cohen reclamando: houve um tempo em que o outrém o deixava ver o que rolava “por baixo”, mas agora essa pessoa não mostra mais nada. É um verso ambíguo: fala de expor sentimentos, mas também de ver o corpo nu, de se entregar ao sexo. Prova disso é o verso seguinte: se lembra quando eu entrei em você?. O termo holy dove – pomba sagrada – é um dos mais controversos. A palavra dove é constantemente substituída nas versões da música. É novamente ambíguo: pode significar paz – entre esses dois indíviduos, algo que já não há -, mas traz um toque de sacrilégio, como se o sexo fosse algo digno de adoração, sagrado.

No último verso, outra referência extremamente erótica: e cada suspiro que dávamos era um Hallelujah. O relacionamento claramente desandou, a forma de amar não é mais a mesma, mas ainda assim surge um Hallelujah.

hallelujah3Conclusão

Leonard Cohen de certa forma conclui tudo ao falar: “talvez exista mesmo um Deus, mas tudo que aprendi sobre o amor foi como atirar em alguém que desarmou você“. Ele usa duas imagens belíssimas: um choro no meio da noite ou alguém que “viu a luz”. Amar não é isso. É apenas um Hallelujah frio e quebrado. Hallelujah, Hallelujah.

Leonard Cohen at the Arena in Geneva, 27 October 2008

 

PS.: Eis a versão de Rufus Wainright, que aparece no filme Shrek.

Não Pod Raul #02 – Foo Fighters

Olá!

Esse é o episódio piloto do Não Pod Raul, o podcast do blog Não Toco Raul. Nele, Eder, Tadeu e convidados farão semanalmente uma playlist de um artista, banda ou tema, composta por 10 músicas. Simples, não?

A intenção é formar a playlist definitiva – daquele momento, de todos os tempos, da última semana – do artista, banda ou tema. Mande sua sugestão de tema pra nós, a sua playlist preferida e onde erramos e acertamos nas escolhas das músicas.

Ah, o Não Pod Raul sai toda quarta-feira.

Então sejam bem-vindos e sentem o dedo no Play logo abaixo 🙂

Clique aqui para fazer o download

> 00:00:20- Tema
> 00:05:47 – Playlist
> 00:46:56 – Comentário e P.Diddys
> Duração do episódio: 00:49:50

 

Gostou da playlist? Odiou? Tem alguma sugestão de playlist bacanuda?
Manda pra gente nas xoxó media ou envia um email para contato@naotocoraul.com.br

 

Links:

Dave Grohl: Talento ou Carisma
Right Track #6 Foo Fighters vs. Drive

 

16 motivos porque a Mc Mayara é melhor que Anitta

A funkeira Anitta sempre teve uma posição ~polêmica em relação ao seu suposto discurso feminista. Em “O show das poderosas” ela traz para os holofotes o empoderamento feminino, mas também reforça a rivalidade entre as mulheres quando fala DAZINIMIGAS. Ela trouxe o funk pro mainstream, mas está longe de ser porta voz da periferia e o que ela atualmente produz tá muito mais pra um funk “domesticado”, que pode ser provocativo, mas não ofende a moral da família brasileira (sdds Mama). Essa semana Anitta fez todas as mulheres shorarem sangue quando, no programa Altas Horas, defendeu um discurso machista e conservador sobre feminilidade e liberdade sexual dizendo que as mulheres de hoje provocam os homens a pensar mal delas entre outras falas lamentáveis. Assim não dá pra te defender amiga. Depois dessa fica difícil acreditar no discurso “feminista” da funkeira: o que tem de real e o que é assessoria de seus produtores pra usar o movimento como moeda de troca e vender mais discos? Pra combater o ~feminismo de boutique~ e mostrar que tem sim mulheres fazendo funk com uma postura bacana e dando a cara a tapa a gente montou uma lista mostrando porque a paranaense Mc Mayara vence essa disputa contra o patriarcado por flawless victory:

1) Primeiramente porque a Mc Mayra segue sempre a máxima: “Ela não sofre, ela curte a vida, ela é feliz, ela é bandida”.

 

2) Ela é fora dos padrões funkeira-mulher-fruta-toda-trabalhada-no-whey-protein, mas arrasa na pixxxta porque sabe que é gostosa do seu jeitinho.

 

3) Ela é conhecida como “novinha do eletrofunk” e já teve que comprovar sua maioridade ao Ministério Público para continuar se apresentando publicamente como cantora.

4) Ela também já foi denunciada para o Conselho Tutelar por conta de suas letras de duplo sentido.

 

5) Ela vai contra a sociedade machista que acha errado mulher sair sem o namorado:

 

6) Mc Mayra se identifica com as ideias feministas e faz questão de apoiar o movimento.

 

7) Ela vai no SBT cantar “Teoria da Branca de Neve, porque eu vou ter um se eu posso ter sete?” acompanhada desses ~anões:

 

8) E no Programa da Eliana ela bate o pé quando o sertanejo Daniel é babaca e levanta a bandeira feminista em canal aberto: “TEMOS OS MESMOS DIREITOS QUE OS HOMENS, NÃO É MENINAS?”.

 

9) Ela tem “As Teorias da Mc Mayara”:

 

10) Ela homenageia as nossas eternas divas Spice Girls e ainda esculacha os boy que não deram bola pra ela no passado:

 

11) Ela defende a liberdade sexual da mulher sair com quantos caras ela quiser:

 

12) Ela é mãe da Manu e posta fotos fofinhas da filha na sua fanpage.

 

13) Aliás, ela causou ~polêmica quando, aos 18 anos, gravou o clipe “Ela sabe rebolar” gravidinha e mandou a real pros moralistas: “Gravidez não é doença”.

 

14) Ela vai lançar um novo clipe com referência a estética do filme Sin City, do quadrinista Frank Miller e dos cineastas Robert Rodriguez e Quentin Tarantino.

 

15) Detalhe pra sinopse: “Mc Mayara surge no papel de femme fatale, uma vilã sensual e perigosa que, com ajuda de suas capangas, sequestra os homens que ela quer para usar e abusar em seu esconderijo!”.

 

16) É Anitta… Hoje não deu pra você: Mc Mayra >>> Anitta.

Slow dancing in a burning room, a origem

slowdancingSlow dancing in a burning room é a oitava música do álbum Continuum (2006), o terceiro na carreira de John Mayer e aquele em que ele redefiniu seu som, adicionando elementos de blues e soul music. Ela sequer foi explorada como single, mas está entre as preferidas do público e foi incluída em DVDs e outras compilações. John Mayer tocou-a nos dois shows que fez no Brasil, em 2013. Além de tudo isso, trata-se de uma belíssima metáfora.

Pintar essa incrível imagem – dançando lentamente em um cômodo em chamas – foi a forma que John Mayer encontrou para definir um relacionamento problemático que se encaminha para um fim dolorido, mas do qual os envolvidos continuam se aproveitando. O mundo está desabando ao redor e não há como escapar, mas eles seguem juntos, dançando lentamente, olhando nos olhos um do outro. A origem dessa música é também sua consequência: dor.

John primeiro avisa que a coisa é séria, não apenas mais uma briga seguida por um período de calmaria. Trata-se de um “último e profundo suspiro desse amor em que estivemos trabalhando” – a hora é essa, portanto. A explicação vem na segunda estrofe, em que mostra que não tem mais o controle da situação e que essa relação já deu alarmes falsos demais. Como na parábola do menino e do lobo, ninguém mais leva a sério o perigo, diante de tantas ameaças que se mostraram infundadas.

Ou seja, slow dancing in a burning room.

Esse quadro ruim é melhor descrito na terceira e quarta estrofes. John reconhece: eles eram tudo o que sonharam para si mesmo. E aí começam os problemas. “Eu vou tirar o máximo dessa tristeza”, diz ele, prometendo se reerguer. “E você vai ser uma vaca, porque você sabe ser assim. Você vai tentar me acertar para me machucar, então vai me deixar me sentindo mal porque não consegue entender”. Ela, portanto, não reconhece essa situação como tão grave.

Aí ele sugere: “vá chorar, vá”. E avisa: “querida, estamos dançando lentamente em um cômodo em chamas”.

A música termina com John Mayer fazendo perguntas retóricas. “Você não acha que já deveríamos saber disso? Você não acha que deveríamos ter aprendido?” Talvez. Talvez ela tenha falhado em perceber todos esses problemas. Eles certamente falharam em deixar tudo chegar a esse ponto. Mas assim é fácil falar. Com o clima que ele cria na música e essa letra, até o ouvinte se sente dançando lentamente em um cômodo em chamas.

PS. Essa arte sensacional do tumblr Scratching Colours

Slow Dancing In A Burning Room

Projota, o romântico

O rapper Black Alien – aquele que cantou no Planet Hemp e tem um único e excelente disco solo, Babylon by Gus – canta na música Timoneiro: “cai o muro de Berlim e as rádios tupiniquins ainda amarelam de tocar algo assim”. Este ano, o fim da divisão da Alemanha completou 25 anos. Quando caiu o muro, o mundo mudou – acabou a Guerra Fria, o capitalismo venceu e os Estados Unidos se tornaram potência hegemônica. A ditadura estava no fim no Brasil, a tecnologia avançava a passos largos. E, mesmo assim, o rap ainda não tocava nas rádios. Vamos a 2014. A coisa começou a mudar, mas ainda não há uma cena rapper no mainstream. Quem capitaneia, nesse momento, esse nicho é Projota, o romântico.

Projota lançou esse ano seu primeiro álbum por uma grande gravadora, Força, Foco e Fé. Mesmo que você não tenha ouvido um acorde dessas músicas, provavelmente já conhece a voz do rapper. Ele está estourado nas rádios com o hit Cobertor, ao lado da funkeira Anitta, mas também já cantou em Deixo Você Ir, do Onze20, e Se Joga, do Strike. Mais conhecido do que ele no mundo pop mainstream, só se for algo do Marcelo D2 ou a música Vagalume, que tem o rap do Pollo, mas faz sucesso pelo refrão de Ivo Mozart. Em todos esses trabalhos, Projota rima de forma descontraída, divertida e romântica. E isso é bem o estilo dele.

Não que não tenha o lado mais pesado em seu trabalho. Pelo contrário. Basta ouvir Samurai, Pra Não Dizer que Não Falei do Ódio e Fatality, para dar um exemplo de cada mixtape lançada de forma independente por ele até hoje. Na última delas, Muita Luz (2013), ele já dava o tom que acabaria por se destacar com a música Mulher, com participação de Marlos Vinícius, do Onze20: o refrão e a ponte têm melodia marcante que contrasta com o verso, no qual o flow e a raiva de Projota estão bem suavizados. Funciona, e essa fórmula ele levou para o novo trabalho.

Três músicas do disco novo são marcantemente românticas. Enquanto Você Dormia mostra um homem apaixonado, curtindo esse momento enquanto observa a namorada dormir. O Vento é mais uma declaração de um cara que encontrou “a paz pro Oriente Médio do meu coração”. Foi Bom Demais, por outro lado, é quase um pedido de desculpas para uma relação que acabou, mas deixou boas lembranças depois das mágoas iniciais. Elas vêm uma em sequência da outra no disco, nessa exata ordem, o que provavelmente não é coincidência nenhuma. Isso sem contar Mulher, que foi incluída de novo em Força, Foco e Fé.

Em entrevista ao portal Terra, Projota declarou que o objetivo do novo álbum é mesmo bater de frente no mainstream, tocar na rádio. Provavelmente, essas músicas cumpram um papel importante nesse plano. De quebra, ele consegue cada vez mais público feminino. “Elas gostam, principalmente quando eu faço musica romântica, e aí agrega, porque elas começam a ouvir o meu trabalho e conhecem o resto, as outras musicas mais pesadas, e gostam, e isso é muito louco”, comentou. Sobre a preocupação com o romantismo, ele foi sincero: “eu nao posso ficar me policiando, porque eu não me policiei para chegar aonde eu cheguei. Se eu começar agora, talvez seja um problema“.

Projota é romântico mesmo e é bom no que faz. Não vai surpreender se muitas de suas músicas tocarem em novela, propagandas e rádios. É assim, também, que o rap conquista seu espaço.

EXTRA

Você já ouviu, então, a música do Projota com a Anitta, Cobertor. Sugiro que ouça, também, a versão que parece ser a embrionária. Ela está como faixa extra no Foco, Força e Fé. É mais swingada, mais agitada e menos solene. Mais divertida, portanto.

A volta dos Racionais MC’s

Os Racionais MC’s são considerados como o grupo mais importante de rap do Brasil. Em 2014, eles comemoram 25 anos de carreira e, em dezembro, lançam um disco novo, que será seu sexto álbum de estúdio – e o primeiro disco cheio de inéditas em 12 anos. Com tudo isso, não é de espantar o quanto a volta dos Racionais é ansiosamente aguardada pelos fãs.

Ontem, foi divulgado o primeiro single do disco novo, “Quanto Vale O Show”:


A nova música foi produzida pelo DJ Cia, do RZO, em parceria com o próprio Mano Brown, dos Racionais. O tema do clássico filme “Rocky Balboa” foi usado como sample em alguns trechos da canção, que traz Mano Brown rimando sobre sua adolescência na periferia de São Paulo nos anos 80.

O disco novo do Racionais foi mixado e masterizado no Quad Recording Studios, em Nova Iorque, onde também já gravaram artistas como Jay-Z, Lil Wayne, Coldplay, Whitney Houston, Busta Rhymes e Alicia Keys. O álbum ainda não tem nome divulgado, mas a expectativa é que esteja disponível a partir do dia 25 de novembro (semana que vem) com exclusividade na loja digital Google Play.

O show oficial de lançamento do novo disco está marcado para o dia 20 de dezembro no Espaço das Américas, em São Paulo. Dá pra comprar ingresso aqui.

12 de novembro: Dia Mundial do Hip Hop

B-boys dançando break no centro de São Paulo, nos anos 80. Agaixado, Nelson Triunfo, um dos ícones do movimento Hip Hop no Brasil

Hoje é o Dia Mundial do Hip Hop. O movimento foi criado em Nova Iorque na década de 70 e agora completa 38 anos. E, no Brasil, ele nunca esteve tão bem.

Entendedores já sabem que a cultura Hip Hop é composta por quatro elementos: o grafite, o break (a dança dos B-boys), o DJ e o MC.

Mas, considerando o Hip Hop simplesmente como gênero musical, é indiscutível o seu crescimento no Brasil nos últimos anos. O estilo se popularizou ainda mais, transbordou as fronteiras da periferia de vez e, felizmente, levou acesso para muito mais gente a artistas tão bacanas que temos por aqui e que sempre mereceram mais valor – como o Criolo, que faz rap há mais de 20 anos e só foi estourar com seu segundo disco, o consagrado “Nó Na Orelha”, de 2011.

O grafite também estourou no mundo todo pra valer de uns dez anos para cá; e artistas brasileiros como Os Gêmeos agora são mega famosos internacionalmente…mas vamos focar na música.

Aposto que não foi coincidência o cantor e rapper Rael ter lançado justo hoje a parte 2 da música e homenagem “O Hip Hop É Foda”:

A música nova conta com a participação de Emicida, Marechal, KL Jay (do Racionais MCs) e Fernandinho Beat Box, além do B-boy Pelezinho e do grafiteiro Does. A canção foi inspirada em “A Bossa Nova É Foda”, do Caetano Velloso. Clique aqui para ver a parte 1, lançada em 2013, que também é muito boa.

DJ Hum e Thaíde

Este ano, temos muitos lançamentos de álbuns inéditos de Hip Hop de qualidade no Brasil. O tradicional grupo RZO voltou e, nas últimas semanas, saiu disco novo do Projota, da Lurdez da Luz e do próprio Criolo. Em dezembro, sai disco novo do Racionais. Os shows, os clipes, a produção e os discos do gênero estão cada vez mais profissionais e hoje já não perdem em nada para os rappers gringos. É, o Hip Hop brasileiro também é foda.

Cool covers: Walk Off the Earth

O cover de Royals, da Lorde, é um exemplo da mistura louca que o Walk Off The Earth faz nos vídeos que popularizaram a banda no Youtube. O canal dessa banda canadense tem quase 2 milhões de inscritos e 436 milhões de visualizações, números bombados pela complexidade e criatividade de alguns dos vídeos. Com uso de instrumentos incomuns e muito ‘looping’ – gravação de trechos que são repetidos e controlados digitalmente -, eles ainda são extremamente divertidos e carismáticos.

“Nós queremos levar a música, qualquer que seja, a uma direção diferente e fazer as pessoas ouvirem isso”, explicou Gianni Luminati, o cabeludo cantor que constantemente usa tranças, em entrevista ao site Outline. “O uso de objetos para criar sons é mais uma mentalidade infantil, é coisa de criança. É quando você vê algum objetivo e imagina que som ele faz”, disse Sarah Blackwood, a cantora loura que de vez em quando faz as vezes também de cameraman.

O Walk Off The Earth não faz só covers, obviamente. Gianni e Sarah, junto com Ryan Marshall, Mike Taylor e Joel Cassady, têm dois álbuns lançados – o último deles chamado R.E.V.O, de 2013. O som, como pode se imaginar baseado nos covers, é de difícil definição, já que os elementos usados nos vídeos seguem nas músicas autorais, embora menos excêntricos. É uma boa banda. Com cool covers. Eles têm muitos. Separamos os mais interessantes.

Shake It Off – Taylor Swift

Rude – Magic

Payphone – Maroon 5

Somebody That I Used to Know – Gotye

Someone Like You – Adele

Love The Way You Lie – Eminem feat. Rihanna

Taylor Swift confronta, ignora ou usa o Spotify?

Não houve trocadilho musical que impedisse a decisão bombástica da cantora americana Taylor Swift, que no início da semana passada retirou todo o seu catálogo do serviço de streaming Spotify. A empresa postou playlist engraçadinha pedindo a volta dela e usou nomes e trechos de diversas músicas, em mensagem postada: Taylor, we were both young when we first saw you, but now there’s more than 40 million of us who want you to stay, stay, stay. It’s a love story, baby, just say, Yes. Não adiantou. Todos sabem o motivo dessa manobra. Só não se sabe ainda os efeitos.

Taylor já vinha sinalizando que tomaria ação contra serviços como o Spotify. Em entrevista recente ao Wall Street Journal, afirmou que música não deveria ser gratuita porque “é arte, e arte é importante e rara, e coisas raras e importantes devem ser valorizadas”. Ela não concorda com os direitos pagos pela empresa, entre US$ 0,006 e US$ 0.0084 por execução. Se a cantora recebe a maior cota, você teria de ouvir uma música 120 vezes para render a ela US$ 1. Taylor Swift tirou sua obra do alcance de 40 milhões de pessoas – cerca de 10 milhões que pagam valores mensais – em 58 países.

Primeiro, Taylor retirou de lá o álbum mais recente, 1989 (2014). Esse é o primeiro a vender 1,3  milhão de cópias desde 2003, quando Eminem conseguiu esses números com o The Eminem Show. Ele desafia os números decadentes da indústria musical na última década. E mais: de acordo com o jornal britânico The Guardian, 25% dos usuários do Spotify já ouviram alguma música da cantora americana, sendo que ela aparece em 19 milhões de playlists e seu single mais recente, Shake It Off, era o número 1 em streamings. Mesmo assim, ela na sequência tirou tudo.

“O que eu posso dizer é que a música está mudando tão rápido, e o cenário da indústria musical em si muda tão rapidamente, que tudo que é novo, como o Spotify, me parece um grande experimento. E eu não estou disposta a contribuir com o trabalho da minha vida com um experimento que eu sinto que não recompensa de forma justa escritores, produtores, artistas e criadores de música. Eu simplesmente não concordo com a perpetuação da noção de que música não possui valor e deveria ser gratuita“, explicou a cantora, em entrevista ao Yahoo! Music na terça passada.

Parece justo, Taylor. Mas até onde você vai levar isso?

Afinal de contas, serviços como o Spotify estão custando dinheiro a artistas como Taylor Swift: de acordo com a revista americana Money, uma pesquisa da MIDiA Reserch determinou que 23% dos usuários de streamings costumavam comprar mais de um álbum por mês. Isso significa que agora a cantora vai aumentar ainda mais os números de vendas? Não. E essa é a questão. Se os fãs não piratearem os álbuns, vão simplesmente recorrer ao Youtube, Grooveshark, SoundCloud, Pandora, LastFM, Rdio ou qualquer outro modelo semelhante e continuar ouvindo suas canções. E talvez pagando ainda menos.

taylor1989A não ser que a cantora apareça com alguma alternativa revolucionária, a decisão vai se limitar a não compactuar com algo que com o que ela não concorda – o que é mais do que justo, mais uma vez. Uma hipótese é Taylor Swift estar usando seu absurdo potencial de mercado para produzir mudanças nesse sistema de remuneração que julga incorreto. Essa hipótese é reforçada pela notícia de que o iTunes deve lançar um serviço de streaming para fazer frente ao Spotify. A cantora deverá ser procurada. E se aceitar, as milhões de pessoas que ouviram suas músicas poderão migrar de programa.

Se nada mudar, o Spotify vai sobreviver sem Taylor Swift da mesma forma como sobrevive sem Beatles, AC/DC e The Black Keys, entre outros artistas que não liberam sua obra para o serviço. Se na semana que vem ela desistir da decisão e recolocar as músicas à disposição, já vai ter saído no lucro, de qualquer maneira. Tem sido apontada por publicações do mundo inteiro como uma das artistas mais poderosas da indústria musical, obrigou essa discussão a ocorrer e ganhou mais mídia do que jamais conseguiria no Spotify. O jornal The Guardian até relacionou o anúncio a uma posição feminista da artista. Isso, Shake it Off jamais renderia.

PS1. Já falamos de Taylor Swift aqui antes e de maneira não tão lisonjeira. Leia

PS2. SE ESSE ÁLBUM REALMENTE SAÍSSE EM 1989, SERIA ASSIM:

Ouvi Butcher Babies e gostei do que vi

Comecei a ouvir Butcher Babies recentemente. Conheci a banda pelo Spotify, que a indicou baseado nas músicas que eu andava ouvindo. Vi na listagem que havia apenas um álbum. Dei o play. Até então, a única referência era a capa: uma coisa sombria, uma criança olhando para um casal adormecido na cama – provavelmente os próprios pais. Eu esperava uma faixa de introdução ao estilo abstrato, como é de costume com essas bandas, mas o que ouvi foi a primeira música: I Smell a Massacre. Gostei.

São quatro acordes até a bateria entrar com tudo, pedais duplos e um berro agudo. Na hora, me lembrou a introdução de People = Shit, do Slipknot. Será que é uma mulher berrando? A faixa avança mais um pouco, e eu entro em dúvida: parece que ouço duas mulheres alternando berros com vocais harmoniosos. Se for uma só enfiando camadas de voz na música, vou parar de ouvir, pensei. Isso faria da banda algo muito artificial. Mas não. Eram duas vozes bem diferentes. Gostei mais.

Escutei mais umas quatro faixas, cada vez mais satisfeito com a pegada, já achando tudo muito inspirado em Pantera e Lamb of God. Não há um segundo de lirismo na voz das vocalistas. Abri o Google e digitei o nome da banda para finalmente ver o estilo, a aparência. Quase caí da cadeira. Encontrei duas modelos seminuas, corpos esculturais segurando microfones com facas e serras-elétricas acopladas, à frente de uma banda de homens maquiados para um filme de terror, estilo Rob Zombie.

butcher

Heidi (à esq.) e Carla

Foi importante ouvir a banda antes de vê-la porque, para a maioria das pessoas, ocorre o contrário. Ouvi Butcher Babies e gostei do que vi é um comentário maldoso muito difundido nos sites de heavy metal, que ironizam a qualidade da banda e creditam a atenção ganha – que nem é tão grande assim – à aparência e ousadia da morena Carla Harvey, escritora e ex- repórter da Playboy TV; e de Heidi Shepperd, hoje de cabelos vermelhos, radialista e modelo. As duas são espetacularmente lindas. Mas e daí?

A princípio, as duas encarnavam o que chamavam de sluty metal. Inspiradas em Wendy O. Willians, vocalista e líder da banda Plasmatics, elas se apresentavam de topless, com esparadrapos cobrindo os mamilos. Quase sempre são essas fotos que aparecem em matérias e resenhas. Wendy, que se matou em 1998, fazia esse tipo de coisa – inclusive com berros nas músicas – no começo dos anos 80. Era uma transgressora. E tinha, também, um corpaço. Não é difícil relacionar os dois casos. O nome Butcher Babies vem de um EP Solo gravado por Wendy em 1980, chamado Butcher Baby. Hoje em dia elas não usam mais esse visual.

Wendy O. Williams

Wendy O. Williams

É complicado tentar entender porque a banda atrai tanta crítica. O som é bem feito, coerente. Não há indícios de que os vocais sejam artificiais. Faltam vídeos oficiais da banda a não ser clipes, mas há alguns shows gravados de forma amadora no Youtube, e as duas seguram a bronca no mínimo satisfatoriamente. Tudo recai, então, no visual, que é obviamente explorado pela banda na figura das vocalistas. Sobram comentários dizendo que as duas não precisariam colocar os peitos de fora para fazer sucesso. Mas por que elas não podem fazer isso? O assunto, é claro, envolve machismo.

A discussão é complicada, mas tem avançado no rock em geral. A presença feminina na indústria da música – e, principalmente, no universo do rock – infelizmente ainda é imensamente inferior em relação à masculina, mas sobram exemplos como Joan Jett, The Donnas, Kittie, Walls of Jericho, 45 Grave, Evanescense eArch Enemy. Tem mulher fazendo som pesado para todo tipo de estilo. Que Carla e Heidi se vistam da forma como quiserem para se apresentar. Você pode não gostar do estilo, da voz, das músicas. Mas não dá para – e acho que nem teria mais como – limitar as vocalistas e o Butcher Babies apenas às aparências.

Recentemente, a banda saiu em turnê com o Down, de Phil Anselmo (vocalista do Pantera); e com o Black Label Society, de Zakk Wylde, guitarrista do Ozzy osbourne. Os dois monstros do rock não devem estar ligando mais para como elas se vestem do que para o som que fazem. Um conselho de um cara que ouviu Butcher Babies antes de ver a banda: coloque o fone de ouvido e ouça a intensidade do álbum Goliath (2013). É tão intenso quanto a beleza das vocalistas. E mais relevante do que isso tudo também.